10/03/2011


Sobre a importância dos anúncios eróticos numa revista literária



Há dias, numa longa viagem de Shinkasen (o combóio-bala), li o New York Review of Books que mão amiga (obrigado LC) me enviou da Europa. Chegado às páginas finais, dou com duas páginas de anúncios e uma coluna de “serviços pessoais”. À cabeça, este texto:

Erotic, intelligent, imaginative conversation. Uninhibited telephone exploration of your sexual fantasies. Discretion assured. Julia

Dei por mim a pensar que percebi o que falta no nosso lusitaníssimo JL: uma página de anúncios eróticos. Isto de pensar que os homens de letras não têm escondidos dentro de si os mais sórdidos pulsares sexuais é um moralismo bacoco mal disfarçado, herdado de salões de compostura só aparente. Conheço alguns intelectuais de espírito finíssimo e de avassaladora cultura, que não resistem a um certo tom badalhoco e à vulgaridade chavascal. Há aliás uma certa tradição literária muito portuguesa nesse domínio, que passa por Bocage e que, mais recentemente, teve expoente em Luiz Pacheco (já para não falar no celebérrimo blog O Meu Pipi, cujo autor nunca foi conhecido).

A ideia de anúncios eróticos numa publicação dirigida a um público intelectual é um mercado por explorar devidamente mas que talvez possa ter sucesso. Conheço alguém que dizia que podia aceitar tudo menos dormir com alguém que não soubesse comer à mesa. Estou certo que há quem pense nos mesmos moldes – tudo menos alguém que não saiba escrever uma frase como deve ser. Aliás, na mesma secção de “serviços pessoais”, havia um desabafo de uma tal Rebecca que admitia in today’s world it’s not easy to find somenone who can craft a well-written letter.

O amor é o domínio fecundo da improbabilidade. Amigos intelectuais: deixem-se de vergonhas. Para quem possa estar interessado, o número da Julia, autora do anúncio, é + 1 617 661 3849.

Sem comentários:

Enviar um comentário