17/01/2011

TUNES, Avenue Bourguiba, Maio de 2010



Por causa do povo na rua em Tunes, comecei a ler há dias um livro chamado "Amours Errantes", de Ali Bécheur, que comprei numa livraria esconsa, em Tunes, em Maio passado. Passeava eu pela pequena secção francesa desta livraria escura mas charmosa quando dei com este livro dum advogado e activista tunisino e que comprei pela simples razão que o livro tem uma epígrafe de Fernando Pessoa.

Sobre o livro, que foi um best-seller na Tunísia, lembro-me de ter falado nessa mesma tarde numa esplanada na Avenida Bourguiba com um jovem assistente universitário, investigador em Oxford e em Siena, onde escrevia uma tese sobre literatura italiana. Gente de espírito fino, portanto.

Feito o intróito literário, consegui desviar gentil e cautelosamente a conversa para a política como era minha intenção. E o meu interlocutor garantia-me que Ben Ali era um democrata, eleito democraticamente pelo povo.

- Mais il a gagné les elections avec 99% des voix. Vous croyez que ça c'est normal? Vous avez vu ça en Angleterre ou en Italie, ou vous habitez quelques mois par an?, respondi.

Respondeu-me com a sabatina habitual nestes casos e que já conheço de cor: que eu queria analisar a situação com os olhos de um europeu, que tinha de compreender que existia mundo fora da Europa de Bruxelas, etc.

- Le Président Ben Ali est un père du peuple, il fait tout pour nous, on vit en pleine liberté et on en profite. Mais vous ne comprennez pas ça en Europe.

A conversa ainda continuou comigo a apontar exemplos e a fazer perguntas. Mas a verdade é que nenhum de nós se deixou demover.

Agora que o "pai do povo tunisino" partiu num avião sem regresso para a Arábia Saudita, tenho-me lembrado deste jovem investigador, um intelectual poliglota. Porventura, se estiver em Tunes, também andou pela rua a gritar pela liberdade. Mais vale tarde do que nunca.

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