AFTERNOON TEA, PENINSULA HOTEL
(ou fotografia da ideia de patronising)
Há mais de 80 anos que no lobby do Hotel Peninsula, em Hong Kong, se serve o chá da tarde. Passaram por ali governadores e generais, aristocratas falidos e plebeus enriquecidos, britânicos e chineses, empresários, espiões e contrabandistas, arrearam-se bandeiras e hastearam-se outras, dispararam-se tiros e assinaram-se tratados de paz, fizeram-se juras de amor e cometeram-se infidelidades, trocaram-se segredos e sussurraram-se palavras para telegrafia diplomática (pré-wikileaks, mas quem sabe...?), fizeram-se negócios e negociatas, contemplou-se o mar e a montanha, disseram-se preces e proferiram-se ameaças – a tudo o Peninsula assistiu e a todos serviu o English breakfat tea, finger sandwiches e scones quentes com compota e cream. Numa cidade que perdeu referências – insisto neste ponto – o chá no Peninsula é o que resta dum tempo em que os ingleses – patronising, como alguém me disse estes dias com imenso rigor e síntese sobre séculos de vida do império governado em Bombaim ou Perth como a mesma elasticidade que reinava em Westminster – desfrutavam de certa concepção de qualidade de vida que, em forma de redoma, criavam onde quer que pousassem arraiais. (Esta é, porventura, a grande diferença com a colonização portuguesa e vê-se, à vista desarmada, quando, num espaço de uma hora de passa de HK para Macau). O que impressiona no chá da tarde no Peninsula é essa imortalização do tempo, uma espécie de recusa quase clínica da contemporaneidade, como se fosse possível viver sem sair das páginas do Great Gatsby ou do Tender is the Night.
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